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História da Música - Introdução
O Ser Humano possui em sua vida sete "dimensões": Física, Espiritual,
Intelectual, Social, Profissional, Afetiva e Familiar. De todas as realizações
do Homem, a Arte é a que mais intrinsecamente permeia todas essas dimensões da
existência humana. E de todas as Artes, a mais antiga é a Música.
Assim como o percurso da História do Homem, na suas lutas e realizações, se
desenvolve na medida de milênios, do mesmo modo a Arte, expressão espontânea,
necessidade da humanidade, floresce em tempos igualmente amplos. É uma
exigência a tal ponto irresistível que não há momento do viver humano, por mais
árduo que possa ser, que não se empenhe na criação artística.
A música é nossa mais antiga forma de expressão, possivelmente até mais antiga
que a linguagem. De fato, a música é o Homem, muito mais que as palavras, pois
estas são símbolos abstratos. A música toca nossos sentimentos mais
profundamente que a maioria das palavras e nos faz responder com todo nosso
ser.
Muito antes de o ser humano aprender a pintar, esculpir, escrever ou projetar
algo, já sabia a produzir e apreciar os sons. Obviamente esses sons seriam hoje
considerados apenas ruídos, mas considerando que "música é a arte de
manipular os sons", o que o Homem primitivo produzia era música, ou um
"embrião" musical.
O "instrumento" musical mais antigo que existe é a voz humana. Com
ela, o homem aprendeu a produzir os mais diversos sons, e a agrupar esses sons,
formando as primeiras linhas melódicas. Depois inventou os instrumentos
musicais, que se multiplicaram e evoluíram ao longo da História. Muitos destes
desapareceram, e a Música mudou muito em todo este tempo. Mas o gosto do ser
humano pela música permanece intacto.
Para se estudar a Música, é preciso antes saber o que é música. A música não
pode ter nenhuma definição objetiva, pois ela conserva um caráter de abstração,
o que a torna algo sem uma definição fechada ou precisa. Ela é uma arte sem
corpo físico, ao contrário do que acontece com a pintura, escultura, literatura
ou a arquitetura, daí sua abstração. Pode-se dizer que ela não tem um
significado, mas o produz em determinados contextos; ou seja, só é possível
entendê-la através do vínculo estabelecido entre a música e os contextos
(sociais, culturais, físicos) a ela ligados.
A música sempre foi uma parte importante da vida cotidiana e da cultura geral
do homem. Hoje vê-se a Música sendo transformada em mero produto pela
"Indústria do Entretenimento". Muitas vezes ela se torna um simples
ornamento que permite preencher noites vazias com idas a concertos ou shows,
organizar festividades públicas, etc. Há um paradoxo, então: as pessoas ouvem,
atualmente, muito mais música do que antes, mas esta representa, na prática,
bem pouco, e possui, muitas vezes, não mais que uma mera função decorativa.
Mas em todo o Mundo ela ainda mantém vivo seu caráter social, de transmitir
sentimentos, de servir de elo com a Divindade, de perpetuar a História, a
língua, a cultura e as tradições de cada povo.
A música é mais sublime das Artes, a arte que homens e Anjos compartilham.
Deve ser ensinada como uma língua, e não como mera técnica e prática, sem vida.
No princípio, todas as Artes estavam vinculadas à Arquitetura: Pintura,
Escultura, Música, etc... Com o passar do tempo, a Pintura e a Escultura
ganharam um status de Artes autônomas. A Pintura saiu das paredes e passou para
as telas. A Escultura passou a ter corpo independente das edificações. Mas a
Música continuou, e continua ligada à Arquitetura, ao espaço (construído ou
não), pois música é acústica, e a acústica depende do meio onde o som é
produzido. Uma mesma música tocada em ambientes diferentes nunca soará da mesma
forma. Cada instrumento ou estilo musical funciona de maneira ideal em
determinados tipos de ambientes arquitetônicos, pois deve ser levado em
consideração o volume sonoro e o volume do ambiente, o eco (que pode ser
prejudicial ou fundamental), a relação músico/ouvinte, e muitos outros
aspectos.
Ao longo da História, a Música esteve tão dependente da Arquitetura, que esta
era composta em função da edificação onde ela sempre era executada (a música
sacra nas catedrais, a música da corte nos salões dos castelos). Mesmo a música
do povo, tocada nas praças e nas ruas, carregavam em sua estrutura a
"aura" do espaço adjacente, do estorno construído. O vazio e seu
entorno também é arquitetura, pois arquitetura é a "arte de organizar o
espaço".
Com a popularização da música, a partir do Século XIX, quando esta ficou cada
vez mais acessível a públicos cada vez maiores, é que começou a ocorrer o
contrário: a Arquitetura dependente da Música. Foram então projetadas as
primeiras salas de concerto, com sua concepção arquitetônica toda voltada para
as questões acústicas.
Este é o tema deste presente estudo: pesquisar a História da Música, analisando
em todos os aspectos sua relação com a arquitetura, em como estas duas Artes
evoluíram juntas, bem como os aspectos sociais, culturais e ideológicos que
determinaram cada uma destas duas Artes.
A História da Música - Gênese e Conceitos de Música
Desde os imemoriais tempos primórdios da História (ou até incluindo o que
chamamos de "Pré História") o Homem cultiva a arte da Música. Podemos
afirmar, sem sombra de dúvida, que a mais antiga das Artes é a Música, pois
antes que o ser humano pudesse pintar, esculpir, escrever ou projetar algo, ele
já podia produzir e apreciar os sons. O primeiro instrumento musical foi a
própria voz humana.
Sabemos, com base nas Sagradas Escrituras, que a música surgiu primeiramente
nas Côrtes Celestiais. Sua função era honrar e louvar a Deus.
Quando Deus criou Adão e Eva, os dotou de musicalidade inata. A primeira
experiência musical do casal foi a música dos Anjos. Com certeza essa foi a
música mais pura e perfeita já ouvida por nós humanos.
Adão e Eva possivelmente também produziam suas próprias músicas, em louvor ao
Criador, e também para seu deleite próprio.
Após a Queda, o Homem já não tinha mais um contato direto com Deus e seus
santos Anjos. Mas a música se perpetuou na vida do Homem. Não sabemos exatamente
como era essa música, mas é possível que boa parte da pureza e perfeição
inicial se perdeu, como tudo neste mundo após o pecado.
Se a Humanidade ante-diluviana era mais o menos homogênea, após o Dilúvio tudo
mudou. A grande catástrofe enviado por Deus alterou completamente o relevo da
Terra, separou os continentes, mudou o clima, os hábitos alimentares de homens
e animais.
Com a confusão das línguas na Torre de Babel, o Homem se espalha pela face da
Terra. Passa a habitar regiões desérticas, densas florestas, ilhas soladas no
meio de oceanos, etc. E passa a exercer uma grande habilidade natural: a
adaptação ao meio ambiente. O isolamento geográfico e a adaptação ao meio vão
gerar grandes alterações no ser humano, não apenas no seu estilo de vida, mas
em sua biologia. Foi assim que surgiram e se desenvolveram as etnias humanas,
classificadas em caucasiana, negróide, australóide, mongolóide, etc. Ou seja,
os brancos, os negros, os amarelos (orientais), os vermelhos, etc.
Essa grande variedade de meios vai gerar uma grande variedade de estilos de
vida, de etnias e de graus de desenvolvimento. Enquanto alguns povos se
desenvolvem enormemente, chegando ao estágio de grandes civilizações, com
grande desenvolvimento tecnológico, com sistema político-social avançado, com o
domínio da Arte (música, pintura, escultura, literatura, arquitetura) e da
Ciência (matemática, física, medicina); outros estacionam (ou até regridem, no
espaço de poucas gerações) num estágio de desenvolvimento bastante primitivo.
Povos que um dia foram capazes de construir embarcações capazes de levar
famílias através de milhares de quilômetros mar adentro, séculos (ou até
milênios) depois foram encontradas isoladas em ilhas, incapazes de construir
algo além de rudimentares canoas de pesca. E foram encontrados por homens
munidos de avançadas embarcações de metal, movidos a propulsão mecânica (a
vapor), nos séculos XIX; e a óleo combustível, no século XX.
Em plena era moderna, ainda havia (e ainda há) seres humanos vivendo de um modo
primitivo; "como na pré-história", disseram alguns pesquisadores.
Neste trabalho a ênfase é dada ao Ocidente, em especial à Europa. É usual
começarmos pelo período da Antiguidade Clássica, das civilizações
greco-romanas. Neste período já havia um grande "abismo" entre os
povos.
Enquanto os gregos e romanos eram muito desenvolvidos, moravam em grandes
cidades com construções avançadas de pedra e alvenaria, com ruas calçadas,
aquedutos, instrumentos musicais como órgão de tubo, harpas, liras, flautas,
trombetas de metal, etc; havia as tribos chamadas de "bárbaras".
Esses povos bárbaros ainda viviam em sociedades tribais, se vestiam com peles,
viviam da caça e da agricultura de subsistência, moravam e cabanas primitivas.
E antes desses existiram na Europa povos mais primitivos ainda, como evidenciam
os achados arqueológicos, como as pinturas rupestres nas cavernas, os artefatos
de ossos, pedra lascada, etc.
No mundo todo se encontrou vestígios da presença de povos primitivos. E ainda
hoje há povos de modo de vida semelhante, como os ianomâmis, os aborígines
australianos (que ainda habitam em cavernas, no deserto australiano), os povos
antropófagos da África, da Oceania e da Ásia. Eles ainda andam nus, (ou se
vestem com peles ou folhas), fazem fogo com paus e pedras, caçam com armas
rudimentares, apenas coletam o que a natureza oferece, não possuem qualquer
forma de escrita, sua língua é simples e com um vocabulário limitado. Esse modo
de vida permaneceu inalterado por centenas e milhares de anos, devido ao
isolamento destes povos. Como não possuem escrita ou meios de registrar sua
história, eles contam sagas de geração a geração, através de lendas.
Se verificou que possuem uma relação de interdependência muito forte com a
natureza, a ponto desta ser deificada por eles. É observando os animais que
eles aprendem muita coisa.
Em suas andanças pela Natureza, esse homem primitivo se deleitava com os
melodiosos gorjeios dos pássaros, com a variada gama de sons (grunhidos,
relinches, urros, rugidos, uivos, latidos, miados, mugidos...) produzidos pelos
mais diversos animais. Podia apreciar também o "assobio" do vento, o
"tamborilar" da chuva, o "sussurro" do riacho, o
"crepitar" da fogueira, entre outros.
O homem também podia produzir (e reproduzir) muitos sons, de intensidade,
alturas, timbres e "texturas" diferentes. Com o arranjo desses
elementos, criou suas próprias linhas melódicas vocais. Essa habilidade foi
desenvolvida ao longo do processo de desenvolvimento da comunicação (não
confundir com desenvolvimento da fala). O modo de comunicação primitivo foi o
tronco comum do qual, no campo sonoro, se destacaram dois ramos distintos: a
linguagem verbal e a música. ( SCHURMANN, 1985)
É importante observar que, dentro do âmbito da música, muitas articulações
sonoras se desvincularam da sua original função comunicativa, para funcionar
como instrumentos de trabalhos mágicos e religiosos. A função mágica, sendo
mais antiga que a religiosa, provavelmente dominava não apenas as manifestações
musicais, mas também as pinturas rupestres das paredes das cavernas.
Segundo SCHURMANN, essas representações, quase exclusivamente de animais,
caracterizam-se por um naturalismo surpreendente e, pelo que tudo indica,
serviam a uma prática de magia.
Cria o Homem primitivo que a produção da imagem de um animal contribuiria
diretamente para a aquisição de poder sobre o mesmo. É muito provável que a
música tenha sido tão naturalista quanto a pintura, e que imitando o relinchar
de um cavalo, o homem julgasse apossar-se não apenas do relinchar, mas também
do próprio cavalo.
A íntima relação entre a música e a religião na sociedade humana é reconhecida
como um fenômeno universal. A música é uma das únicas comuns a todas as
culturas. Em todo o mundo a música está relacionada à religião; na maioria das culturas,
a música acompanha ou é veículo para a adoração.
Nas práticas religiosas, a música era a linguagem mágica do Homem primitivo na
sua invocação aos deuses, aos espíritos e as forças da Natureza, através de uma
melodia cantada. Pode ser usada tanto para expressar gratidão como para acalmar
uma divindade enraivecida, até o ponto de exercer uma influência mágica e
controladora sobre a mesma. Servia para elevar a consciência humana ao místico,
ao mítico, ao cósmico, ao sobrenatural. (STEFANI, 2002)
Essas melodias cantadas também assumiriam um importante papel na prática de
contar estórias. Era por meio de tais estórias que se mantinham vivos os
valores éticos indispensáveis para a estrutura social da época, e se louvavam a
memória de deuses e heróis, narrando façanhas notáveis e enaltecendo a bravura,
a lealdade, o espírito aventureiro e a coragem. Com o desenvolvimento dessas
canções/poemas, a música se afasta de sua função produtiva, e toma um caráter
mais artístico, lúdico, de integração social. (SCHURMANN, 1985)
Ao longo de suas atividades diárias, o Homem descobriu também que, ao bater
paus, pedras (e posteriormente metais) uns nos outros, podia produzir sons.
Verificou que materiais diferentes, de rigidez e tamanhos variados produziam
sons variados na mesma medida, muitas vezes nas mesmas tonalidades que ele
produzia com sua voz. Sugiram assim os instrumentos de percussão.
O Homem também percebeu que ao soprar em sua zarabatana de caça, se produzia um
som característico, como um assobio, e que zarabatanas de comprimentos e
diâmetros diferentes produziam sons de alturas diferentes. Ao puxar e fazer
vibrar a corda de seu arco de flecha, também se produzia um som. Da manipulação
destas propriedades sugiram então os primeiros instrumentos de sopro e os de
cordas. Muitos outros instrumentos musicais surgiram e evoluíram ao longo da
História, outros desapareceram sem que hoje tenhamos contato com eles. Mas o
gosto do ser humano pela música permanece inalterado.
De toda essa riqueza musical da Antigüidade, apenas se tem uma vaga idéia,
através da música dos povos primitivos que ainda se encontram na Terra. Mas a
noção exata de como esta seria se baseia em pura especulação. Assim como a Pré
História só passou a ser chamada de História a partir da invenção da escrita, a
música desse período se perdeu devido à falta de uma escrita musical. A notação
musical só foi desenvolvida no século IX, por um monge, e se desenvolveu até a
que se conhece e se usa hoje na escrita de músicas na forma de partituras.
Obviamente, quando se fala sobre a música "pré-histórica", não se
pode julgar a partir de um conceito atual de música. Este conceito mudou
bastante com o passar das eras. O conceito clássico diz que "música é a
arte de combinar os sons de maneira agradável aos nossos ouvidos". O
conceito Romântico diz que "música é a arte de manifestar os diversos
afetos de nossa alma mediante os sons".
Neste século, com o fim de um único estilo dominante, onde a cada dia nascem
dezenas de novos estilos musicais, dizemos apenas que "música é a arte de
combinar sons e silêncio", conceito que se aproxima muito do que era a
música para o Homem primitivo. A música mais moderna e tecnológica, a chamada
música eletrônica, é predominantemente percutida e dançante, tal qual uma música
tribal.
A música tem o poder de despertar as mais variadas sensações em seus ouvintes.
Pode servir de estímulo; por isso muitas vezes uma pessoa ouve uma canção e se
sente sintonizada com ela e consigo mesma, e se sente melhor e consegue
trabalhar melhor. Pode servir como ativadora da memória, nos fazendo lembrar de
eventos passados, tristes ou felizes; pode nos associar a pessoas, eventos,
lugares, datas especiais. Pode relaxar, excitar, alegrar, deprimir.
A música funciona como estímulo a comportamentos em diversos casos. Depende do
caráter da música, mas o ambiente, o estado de ânimo e a vontade, o gosto
pessoal e o conhecimento musical também influenciam muito. Os sons são muito
ambíguos. O som estridente de uma guitarra excita quem aprecia músicas no estilo
"Heavy Metal", mas pode aborrecer algumas pessoas. O som suave de um
piano enternece o apreciador de música erudita, mas pode incomodar outros que
não apreciam tal música. O mesmo vale para qualquer instrumento ou estilo
musical. E mesmo para pessoas que apreciam estilos variados, uma determinada
música pode lhe agradar ou desagradar, dependendo da ocasião, lugar, hora do
dia, estado emocional, etc.
Num filme, por exemplo, a música não é apenas um fundo; ela acompanha, comenta,
descreve e reforça as diferentes situações. É difícil de nos lembrarmos da
trilha sonora de um filme quando acabamos de assisti-lo, mas com certeza nos
lembraremos das cenas mais marcantes. E estas cenas são marcantes graças ao
reforço da trilha sonora. Uma cena romântica nunca desperta a mesma emoção sem
uma linda melodia a acompanhá-la. Uma cena de ação não produz a mesma
adrenalina sem uma música poderosa de fundo. Uma cena de suspense ou terror não
provocará tanto medo sem uma lúgubre e aterradora trilha sonora. Diversos estudos
foram realizados neste sentido. Diversas pessoas assistiram cenas de romance,
ação, comédia, suspense e terror, primeiramente com as trilhas originais,
depois com as trilhas trocadas, e por último sem som algum. As sensações
despertadas foram as mais diversas possíveis.
Ao contrário, num concerto de música erudita, as pessoas assumem uma postura de
escuta direta e imediata, concentrada exclusivamente na música. A música não
serve para algo, ela é um fim em si mesma.
A música tem diversos níveis de sentido. Os sons são pensados pela mente como
qualquer outra realidade: simples ou complexa, contínua ou descontínua,
repetida, variada, etc. Estes são os primeiros significados. A música pode ser
sentida em vários sentidos: códigos gerais de percepção, práticas sociais,
técnicas musicais, estilo, obra, etc. Mas isso não só quando escutamos
concentradamente, mas também quando cantamos, tocamos, jogamos, dançamos,
estudamos música. Somos capazes, com os sons, de produzir sensações em diversos
níveis.
Quando tentamos definir a música, podemos simplesmente dizer que é uma
seqüência de sons, de tons de altura definida, organizados melódica, harmônica
e ritmicamente, e de acordo com o timbre. Muitos dizem que música é uma ciência
exata, definida pela matemática e pela física.
A música é a arte que tem a maior possibilidade de se libertar de toda
expressão de um determinado conteúdo, para se contentar com uma simples
sucessão de justaposições, modulações, contrastes e harmonia, e assim se
encerrar nos limites do domínio puramente musical dos sons. Mas, nestas
condições, a música permanece vazia e sem significado, e visto que lhe falta um
dos principais elementos de qualquer arte, o conteúdo e expressão, não pode ser
então colocada entre as artes propriamente ditas. Mas quando o elemento
sensível dos sons serve para exprimir o espiritual de uma maneira mais
adequada, a música se eleva ao nível de uma verdadeira Arte.
Há música desde que o som se organize no tempo; mas que sons pode-se considerar
música? É aqui que começa o arbitrário. Todos que produzem som fazem música:
pássaros, animais, homens de todas as etnias, o vento, o mar. Mas não com os
mesmos sons. Cada povo possui uma maneira de fazer e escutar música. Isso
acompanha a formação, a cultura e a própria história de cada povo. Através da
música uma sociedade expressa sentimentos de maneiras características, por isso
cada cultura possui uma forma de expressá-los. A arte tem sido repetidamente
definida por estudiosos do ocidente e do oriente como uma expressão sensorial
da cosmovisão de um povo ou de uma cultura.
Pessoas numa sociedade estruturada de maneira única desenvolvem uma música
igualmente única. Deve ser a estrutura social que forma o estilo musical. A
música não é uma linguagem que descreve como uma sociedade parece ser, mas uma
expressão metafórica de sentimentos associados com a maneira que a sociedade
realmente é. Porque as pessoas criam a música, elas reproduzem na estrutura
básica de sua música a estrutura básica de seus próprios processos de pensamento.
(STEFANI, 2002)
Merriam, um antropólogo cultural, caracteriza a música através da seguinte
definição: "O som musical é o resultado de processos comportamentais
humanos que são modelados pelos valores, atitudes e crenças das pessoas que
compartilham uma determinada cultura. O som musical não pode ser produzido
exceto por pessoas para outras pessoas, e embora possamos separar os dois
aspectos (o aspecto sonoro e o aspecto cultural) conceitualmente, um não está
realmente completo sem o outro. O comportamento humano produz música, mas o
processo é contínuo; o comportamento é amoldado para produzir som musical, e
assim, o estudo de um converge para o outro".
Conclui-se com isso que em qualquer tempo ou lugar, a música será sempre uma
arte extremamente rica e difundida, apesar de carregar esse caráter de
abstração em seu próprio conceito. Entender o que a música é ou representa é
tão importante quanto ouvi-la, e não faz com que a escuta se torne
insignificante, mas atenciosa, e ajuda a fazer a música passar pelo exercício
essencial de contextualização, o que distancia todo o mal gerado pela
ignorância.
Aqui estamos estudando a evolução da música, primordialmente a música
ocidental, ao longo da História. Aparentemente esta intensa mutabilidade é um
fenômeno tipicamente ocidental. Nas culturas orientais, predominantemente
pagãs, a música tem se preservado a mesma por milênios. Nestas culturas, devido
à crença de que os ancestrais se juntavam em rituais de adoração comuns, era
fundamental que a música e as danças se mantivessem tão antigas quanto possível
para que fossem compreendidas por todos os ancestrais e facilitasse sua
participação. Uma das funções da música também era revelar a imutável essência
eterna do universo. Então, seria natural que, uma vez criada, tal música
resistiria às mudanças com o passar do tempo. Mesmo uma religião estritamente
monoteísta, como o islamismo, também preserva diligentemente uma forma própria
de expressão musical. Por que então a música ocidental mudou tanto?
Uma organização religiosa (ou mesmo política) incute uma ideologia, um conjunto
de valores e, talvez, cria uma ação ritual tal como uma liturgia ou uma atitude
em relação a um modo de vida como parte de sua filosofia. Embora nada
específico seja dito ou escrito sobre as artes, há um estímulo natural em
descobrir a expressão artística implícita, adequada a essa ideologia.
Mas os valores que os homens dos séculos passados respeitavam não parecem,
hoje, importantes. Essa modificação radical da significação da música se
processou nos últimos dois séculos com uma rapidez crescente. E ela se fez
acompanhar de uma mudança de atitude frente à música contemporânea, aliás,
frente à arte em geral, porque, como a música era parte essencial da vida, ela
tinha que nascer necessariamente do presente. Ela era a língua indizível do
homem, e só os contemporâneos poderiam entendê-la. Devia ser sempre criada com
o novo, da mesma forma que os homens deviam construir para si novas moradas que
correspondessem a um novo modo de existência, a uma nova modalidade de vida
espiritual. Da mesma forma, já não era capaz de compreender, nem de utilizar a
música das gerações passadas.
Por que então buscar saber da música antiga? Porque a música sofreu milhares de
transformações que a distanciam de seu ouvinte contemporâneo. Por isso surgiu a
canção, que é uma tentativa de "humanizar" o som, tornando-o mais
compreensível. A música tem de ser antes de tudo bela. Muitos ainda não estão
preparados para o experimentalismo da música contemporânea. Por isso buscam na
música antiga a beleza e a harmonia tão almejadas.
Mas a música simplesmente bela jamais existiu; pois beleza é um conceito
subjetivo e abstrato; é um componente de toda e qualquer música, mas não pode
ser o critério determinante, pois isso significa ignorar os outros componentes.
Se reduzirmos a música ao belo, tornando -a apenas um componente agradável da
vida cotidiana, fica impossível compreender-mos a música em sua totalidade.
Quanto mais as pessoas se esforçarem para aprender a música antiga, mais perceberão
que ela ultrapassa a beleza e o quanto ela inquieta, pela diversidade e riqueza
de linguagem; e só assim reencontrarão a música contemporânea, aquela que
constitui a cultura de hoje, e a prolonga.
Ao passarmos pelas etapas cronológicas da História da Música, estaremos
abordando os períodos artísticos, e os estilos característicos de cada período.
O estilo tem sido descrito de diversas formas: "um modo característico de
fazer algo", uma "generalização do particular", ou "um modo
de vida". O estilo é usado como produto ou método da ação e da escolha
humana. É uma réplica do modelo, um conjunto particular de características.
(STEFANI, 2002).